Filosofia Moderna no Ensino Médio

Diálogo entre o Coelho e o Lobo

 

Coelho – Isso não leva a nada. Vais bater com a cara no muro. Vais acabar só. Fodido e mal pago. Se não pode com o inimigo, junte-se a ele, coma com ele, faça suas as proposições dele.

Lobo – Isso seria um crime contra mim. Seria um desrespeito, uma imoralidade.

Coelho – Você não sabe? A moralidade subsiste e só é um fato sob o signo do coletivo. Não existe moral para o indivíduo.

Lobo - O que dizes? Não sabes por acaso que sob a moralidade há valor, que o que a dá vida é animal, demasiado animal? Não enxergas que o coletivo é um fantasma que ganhou vida e se voltou contra Ti?

Coelho – O coletivo me protege, portanto, alimentá-lo deve ser minha mais alta aspiração. Além do mais, submeter-me ao que é melhor para o coletivo é a minha forma preferida de demonstrar minha força. Aniquilar-me, enquanto indivíduo, em função do todo, é meu maior motivo de orgulho. Sou forte quando consigo ser humilde.

Lobo - Veja com atenção, meu caro Coelho, a humildade é a sua ilusão de vitória. Na verdade, ela não é nada senão uma necessidade sua. Sua participação na sua invenção é desprezível, 99% do que você é foi moldado em ti na porrada. És humilde porque precisas ser. Se tu ergues a cabeça, um coelho maior, aquele coelhão ali, aquele que está dizendo que a humildade é uma virtude, aquele coelho te acorrenta e te esfola até estares formado.

Coelho – Faz sentido. Mas prefiro isso, a viver só, como você, que sente frio e não come há dias.

Lobo – Compreendo-te, e concordo contigo nisto. A bem da verdade, não recebo a ração diária a que fazes jus abdicando de si, mas ao menos disponho do sagrado que sou Eu. Mil vezes, mil vezes a solidão e o frio do lobo, solidão e frio que me preparam... que a comodidade que me enverga e me quebra e me amolece.

Coelho – (…) Sr. Lobo.

Lobo – Pois não.

Coelho – Você sabe que suas palavras não me são completamente estranhas? Não sei como, realmente não sei como, pois fui adestrado a pensar com lógica, mas sinto que esses absurdos contraditórios são parentes de uma verdade que me escapa.

Lobo – Sério mesmo? Achas realmente isso ou, como é seu hábito, me bajulas.

Coelho – É muito sério. Mas não se anime. Isso não significa que eu vá aderir.

Lobo – Não quero adeptos.

Coelho – Você é realmente estranho. Você me assusta. Mas... mas...

Lobo – Mas o que?

Coelho – Podemos conversar novamente?

Lobo – Acho que não. Não será mais preciso... Ei! Ei, você aí ovelhinha! Podemos conversar?

0 comentários: