Da filosofia universitária e da nossa cagalhonice

Por Rodrigo Lucheta

Estudante sem EU 

O pensamento virou mercadoria.

O adorno universitário virou a purpurina burguesa capaz de encarecer o pensamento, de forma a melhor (mais caro) vendê-lo para nós, incautos idiotas ávidos pela sagrada unção do título.

Da mesma forma que doutos professores de filosofia, fantasiados de viajantes historiográficos, fingem percorrer o passado oficial da filosofia para melhor resistirem a este mesmo passado oficial (quando na verdade estão se colocando no sentido da História para banharem-se da aura justificada historicamente por esta mesma História), nós, alunos, acabrunhados diante do titânico poder que é dado aos sacerdotes do saber, fingimo-nos felizes diante da precária, alienante e mal contada historinha que nos apresentam nas aulas. É simples: basta olharmos o valor que atribuímos às notas (para livrarmo-nos o quanto antes daquilo tudo com nosso venerado título), em comparação com o valor que damos ao conteúdo…

A concentração do poder e a articulação havida entre os detentores de poder (do Vaticano aos Centros de Ciências da Educação...) fazem emanar pela Universidade uma lógica, uma dialética niveladora, cerceadora dos ímpetos individuais. O orgulho vira prepotência, a humildade... uma virtude. Tudo é pensado sob o prisma da mediocridade amorfa que reproduzirá, com seu diploma enfiado no rabo, o sistema que matou nela o indivíduo e pôs no mundo o sujeito (na acepção de sujeitado) castrador.

Na dinâmica reprodutora do atual sistema e estado de coisas, Foucault e os livros de auto-ajuda se complementam. Contra a atividade enérgica dos “utópicos” (arrogantes, prepotentes, impacientes, radicais…), a estratégia que amesquinha a força e inviabiliza o impacto. Contra as subjetividades cintilantes, de aço, irredutíveis... o ideário pequeno-burguês que faz da filosofia um manual para viver como as plantas: os tontos alienados compram livros de auto-ajuda para repetirem mantras diante do espelho; nós, os sábios universitários, compramos livros do Foucault e nos desculpamos na inação fantasiando estratégias que servem apenas para protelar a atividade que criará algo novo… E no presente, a bostidão corre solta.

O método científico é uma arma contra as subjetividades auto-afirmadoras. Com ele, nossos cabedais vernaculares são atirados na privada. O sentido que as coisas representam para nós não podem ser considerados. Vivemos sob a ditadura dos fatos. E só é fato aquilo que algum gordo imbecil determinou em seu gabinete com ar condicionado... Diante dos fatos, às favas a imaginação teórica...

É tudo uma grande novela, meus amigos. Mesmo o pensamento contrário, crítico, negador está preso no macro processo de produção e reprodução do real. Estamos fadados, por essa dinâmica, a morrer no fingimento, como baratas nos debatendo no estômago de Behemoth. Porém, para articular uma resistência digna deste nome, para lutarmos contra as tiranias e os totalitarismos invisíveis (mas não menos mortificadores) que diuturnamente tentam esfolar nossa singularidade… precisamos ser ouvidos. E para sermos ouvidos, precisamos do grito… e, pragmaticamente, também do título, do diploma. Para não sermos encapsulados na categoria do “filósofo de boteco”, incapaz de atravessar o purgatório universitário… obtenhamos o título… com notas máximas, de preferência…

Se a filosofia popstar contemporânea demoliu os fundamentos ontológicos erigidos desde a antiguidade, os filósofos de hoje refugiaram-se na Universidade para nela forjar um fundamento confortável para si... e dele, apedrejam os que sobrevivem do lado de fora.

Portanto, meus caros, não vislumbro saída: se o pensamento é mercadoria e a forma de lidar com o pensamento é seu encarecimento... Fodam-se as convenções, as linguagens padronizadas e padronizantes. Fodam-se os conceitos enlatados por Doutores. Fodam-se os métodos interpretativos e as dinâmicas catadoras de fatos para a legitimação da dominação. É do interior desse organismo que as células precisam começar a expelir suas secreções…

Que uma nova abordagem da filosofia seja inoculada nos palácios universitários (pois eles também precisam tremer…); mas saibamos também pensar para além dos muros dentro dos quais se escondem esses espremedores de culhões que gritam: formação, formação, formação!!!. Quando precisamos de: transformação, transformação, transformação!!!

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